O ex-surfista Miranda conheceu Edileusa há 35 anos, em Santos. Nascida e criada na cidade de Bauru, a estudante passava as férias escolares no litoral com a família. Foi paixão imediata. Duas semanas de praia, sorvete e sexo, aliás, muito sexo. Miranda e Edileusa resolveram se casar.
No começo todos acharam um absurdo. Os amigos de Miranda ficaram indignados, mas no dia da cerimônia todos compareceram. Os pais de Edileusa, que no começo eram contrários, aceitaram o casório ao saber que a garota não era mais virgem – naquele período, começo dos anos 70, era questão de hora para a família casar a moça que fora “desonrada”. Colocaram apenas um porém, que a moça terminasse os estudos.
Foram bons cinco anos de harmonia e dois filhos, Miramar e Mirassol. Mas a grana do surf não enchia a barriga de ninguém e logo Edileusa começou a armar um chororô para que eles se mudassem para Bauru, sua cidade natal.
Lá, ela poderia lecionar na escola do tio e ele poderia arranjar um trabalho que desse mais dinheiro, além de realizar o sonho de viver perto dos pais e de um dia ser enterrada na lápide da família. Após semanas de choradeira, ele cedeu e todos partiram de mala e cunha. Era o fim do surfista Miranda e o começo do taxista Miranda.
Hoje, Miranda está com 60 anos. Sempre que pego táxi com ele, o ex-surfista me fala que realizou todos sonhos da mulher: os sonhos bons e os sonho ruins. Eles se estabeleceram em Bauru, em 1977, cumprido o primeiro sonho. Em 2007, o segundo sonho da esposa era realizado: Miranda enterrou Edileusa no cemitério municipal de Bauru. Miranda passou esses dois anos relembrando sua paixão por Edileusa e cumpriu todos os desejos da Esposa.
Num dia desses, já conhecendo a triste história de cor, disse para Miranda: Miranda, com todo o respeito, mas acho que é hora de você sair, procurar umas garotas, ir à festas. Com todo o respeito, mas acho que até a Edileusa, que está no céu, deve torcer para você dar umas “surfadas” por aí. Sessentão ainda queima muita lenha!
Miranda me olhou pelo espelhinho e deu um leve sorriso.
Hoje pela manhã peguei o táxi com Miranda, percebi em seu rosto um ar de felicidade. Perguntei o que tinha acontecido e ele me disse: O senhor tinha razão, não tô morto, tem muito broto dando corda. Olha que eu fui num bailinho, que não era de véia não, tinha umas mulheres de 30 e 40, tudo boa, e eu acabei me enroscando com uma de 35 anos. Tomei cerveja com ela e dançamos a noite toda. Ela não é daqui, é de Presidente Prudente. Perguntei o que ela tava fazendo naquele baile e ela me disse que estava a minha procura, até achei engraçado. Ela me disse se eu não queria ir embora com ela, viver lá. Ela não tem pai e o avô tá pra morrer e deixou a fazenda pra ela. Disse que o sonho dela era viver lá na fazenda e um dia ser enterrada no cemitério da família.Abismado, perguntei se ele seria bobo de rejeitar a proposta e ele me respondeu:
Rapaz, eu já surfei nessa onda. Disse para ela que eu não tenho mais idade para realizar todos os desejos dela.
E continuamos a viagem sem prosseguir a conversa.
Um comentário:
E os nossos sonhos, né não?
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