17.1.13

Era uma vez eu, Cinema!


Fui assistir, recentemente, o filme de Marcelo Gomes “Era uma vez eu, Verônica” e tive a certeza que o cinema pujante no Brasil vem navegando sobre as águas do Capibaribe numa velocidade estonteante de 24 quadros por segundo.

Assim como a “Febre do Rato”, de Claudio Assis, “Verônica” nos revela um Recife cheio de contrastes, belezas, misérias, alegrias, tristezas e estampa o rosto do nordestino brasileiro incorporado à globalização sem fronteiras e sufocante.

Verônica é recém-formada em Medicina e seu primeiro emprego é num hospital da capital pernambucana. Através das consultas aos pacientes, Verônica vai diagnosticando e ao mesmo tempo se vendo na pele do doente, como se ela fosse a enferma. E ela é. Porém, não há remédio para a sua insanidade. Ela sofre de liberdade. A novata doutora quer liberdade de escolha, de sexo, de amizade, de cidade. Verônica quer viver feliz, mas ela é tomada por doenças sociais patológicas. Nesse mundo violento e obstinado pelo consumo e dinheiro, essa liberdade perseguida por ela é uma afronta.

O filme se desenrola através da relação afetiva com o pai doente, com as amigas fúteis do dia a dia e a relação sexual/carnal com Gustavo (João Miguel).

“Era uma vez...” tem sua história narrada através de um gravador que Verônica tem como fiel confidente desde os tempos de universidade.

Marcelo Gomes constrói, destrói e reconstrói Verônica que cresce no decorrer da trama através da interpretação belíssima de Hermíla Guedes (O Céu de Suely). E você vê, sente e entende as agruras daquele povo – do povo brasileiro.

É bem diferente dos filmes de altas cifras, das produções que levam mais de 1 milhão de espectadores ao cinema nacional e que são alardeadas pela Rio Filmes como tendência de cinema brasileiro forte e de mercado, que até pode ser, porém, é completamente fugaz.

Se a afirmação de alguns dirigentes do audiovisual é ter um cinema de A a Z, prefiro o Z que escancara a cara e a cultura do povo brasileiro do que o cinema A que concentra mais de 80% dos valores em editais, cruza a Vieira Souto ou “Copa” com o custeamento caríssimo e que está atrás apenas de números de espectadores e reais e de, se possível, um prêmio do cinema norte-americano.

“Era uma vez eu, Verônica” traz o cinema pernambucano para o mundo, um mundo maravilhoso e de contrastes com a cara do Brasil.
 

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