10.1.15

Drigo e Guto e uma avenida intolerante

Naquele domingo, Drigo acordou meio-dia, abriu a janela de frente à avenida 9 de julho e sorriu. Ele e Guto se encontrariam para comemorar um ano de namoro.
Um roteiro nada especial. Se encontrar no Masp, passear pela avenida Paulista, pegar um cinema, comer e tomar alguma coisa, talvez dançar na Loka e voltar para o apartamento e trepar.
Guto acende um cigarro ao lado da pedra do museu quando Drigo chega! Eles se beijam.
Guto dá um presente.
- Billie Holiday, que legal, Gu. Eu adorava esse cd. Alguém surrupiou e eu nunca mais achei.
Ele guarda de volta na sacola e de mãos dadas, olham a freirinha de antiguidades no vão livre do Masp e vão ao Espaço Itaú, na Rua Augusta, assistir um filme que Drigo queria muito ver.
Saem do cinema e vão ao boteco na esquina, pedem um lanche e uma cerveja.
Beijos, carícias. Na mesa ao lado, casais héteros, casais gays, todos aproveitando o final do domingo paulista, em que os termômetros marcavam 31 graus, as 21h15.
Guto segura a mão de Drigo.
- Hoje fazemos um ano, é isso? Diz Guto.
Drigo sorri.
- Eu também tenho um presente para você! Drigo tira do bolso um chaveiro com duas chaves e põe sobre a mesa.
- O meu presente é... Vem morar comigo?
Guto expressa surpresa e felicidade.
- Como assim? Pergunta Guto.
- Assim! responde Drigo.
Os dois se beijam.
- Quer ir para a sua nova casa e ouvir Billie, comigo?
- Claro! responde Guto.
Os dois pagam a conta.
Gu e Drigo caminham pela  avenida Paulista até o Masp, fazendo planos para a nova vida. Eles descem sentido a avenida Nove de Julho.
Já na calçada, próximo ao apartamento, oito rapazes, todos muitos fortes, vêm no sentido contrário.
- Uhm! De mãozinhas dadas, meninas! Diz um dos rapazes.
Guto e Drigo abaixam a cabeça e tentam acelerar o passo.
- Peraí, viados! Eles são cercados pelos rapazes.
Dois seguram Guto.
Drigo pede para deixá-los em paz.

- Por favor, deixe a gente ir, não fizemos...
Antes que Drigo pudesse terminar a frase, um outro rapaz com um pedaço de pau lhe acerta a cabeça. Drigo cai e se escuta um sonido de saco de batata, sem esboçar nenhuma reação.
Guto grita.
Os rapazes empurram Guto que, aos prantos, cai no chão. Ele começa a ser linchado.
Um dos rapazes pedem para parar e sair dali. Eles saem correndo, gritando e comemorando.
Guto mesmo machucado se rasteja até Drigo. Drigo não se mexe. Guto grito por socorro.
A cidade de São Paulo adormece, se preparando para a rotina caótica de mais uma segunda feira.


Isso é uma ficção e qualquer semelhança com fatos reais é uma mera conhecidência.
O Brasil é o campeão mundial de crimes homo-transfóbicos, com um assassinato a cada 28 horas! Segundo agências internacionais, 40% dos assassinatos de transexuais e travestis no ano passado foram cometidos no Brasil. Os gays lideram os “homocídios”: 186 (59%), seguidos de 108 travestis (35%), 14 lésbicas (4%), 2 bissexuais (1%) e 2 heterossexuais.

Uma intolerância que precisa acabar. 

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